domingo, 24 de outubro de 2010

Homogeneidade Racial, Religiosa, Etária, Visual e Outras A Diversidade no meio ambiente do trabalho



O tema sugerido foi a Homogeneidade Racial, Religiosa, Etária, Visual e outras.  Homogeneidade, qualidade de homogêneo, liga-se à idéia de ausência de desigualdade, de diversidade, aquilo cujas partes ou unidade não apresentam ou quase não apresentam dessemelhanças (Dicionário Aurélio).

Considerando que a sociedade brasileira não é homogênea, sob o ponto de vista étnico, racial, político, religioso, sindical,  cultural, etário, de gênero, de renda,  com pessoas portadoras de deficiências aparentes e deficiências não-aparentes (estes últimos, os “normais”), enfim, que a nossa sociedade é repleta de diversidade, o que se espera é que tal diversidade seja refletida no microcosmo do trabalho.   Isto, contudo, não ocorre.

Para ficar apenas na questão do gênero e da raça, o “Perfil do Trabalho Decente”, publicado em 2009 pela Secretaria Internacional do Trabalho, da Organização Internacional do Trabalho,  que reflete dados estatísticos do trabalho decente no Brasil do período de 1992-2007, anota que:

“Apesar da redução das brechas durante o período em análise, ainda perduram expressivas desigualdades de gênero e raça no mercado de trabalho que contribuem decisivamente para a persistência de significativos déficits de trabalho decente entre mulheres e negros.”  

A consulta dos dados estatísticos da citada publicação da OIT, mostram que o ambiente de trabalho no Brasil ainda é marcado, por exemplo,  por lideranças masculinas de cor branca, havendo forte segregação ocupacional horizontal e vertical:
“no grupo ocupacional ‘dirigentes em geral’ mulheres representavam 23,7% e 29,0%, em 2002 e 2007, respectivamente, enquanto que entre homens tais proporções eram de 76,3% e 71%, respectivamente. As desigualdades de raça também se fazem presentes nos cargos diretivos. Cerca de 88,0% dos dirigentes eram brancos e apenas 12,0% eram negros tanto em 2002 como em 2007, ainda que 53% da população ocupada seja composta por negros.”

Considerando que a eliminação de todas as formas de discriminação em matéria de emprego e ocupação é parte integrante da agenda mínima do trabalho decente, no Brasil e no mundo, devemos devotar esforços em compreender e erradicar os preconceitos e estereótipos que marcam o mercado de trabalho.

Fundamentos jurídicos não faltam para a defesa da diversidade no meio ambiente laboral.

A Constituição Federal, no seu art. 3º, inciso IV, estabelece como um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.”

Mais adiante, no seu art. 5º, inciso XLI assim dispõe:

“Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
(...)
XLI – a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais”;

No mesmo sentido estatui a Lei 9.029/95, no seu art. 1º:

“Art. 1º Fica proibida a adoção de qualquer prática discriminatória e limitativa para efeito de acesso à relação de emprego, ou sua manutenção, por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar ou idade, ressalvadas, neste caso, as hipóteses de proteção ao menor previstas no inciso XXXIII do art. 7º da Constituição Federal.”

E finalmente, a Convenção nº 111 da OIT – Organização Internacional do Trabalho, ratificada pelo Brasil através do Decreto nº 62.150, de 19 de janeiro de 1968, impõe o combate a qualquer forma de discriminação nas relações de trabalho.

O ilustre professor Maurício Godinho Delgado, no artigo intitulado “PROTEÇÕES CONTRA DISCRIMINAÇÃO NA RELAÇÃO DE EMPREGO”, in DISCRIMINAÇÃO, Editora LTr, 2000, pág. 97, leciona que:

“Discriminação é a conduta pela qual nega-se à pessoa tratamento compatível com o padrão jurídico assentado para a situação concreta por ela vivenciada. A causa da discriminação reside, muitas vezes, no cru preconceito, isto é, um juízo sedimentado desqualificador de uma pessoa em virtude de uma sua característica, determinada externamente, e identificadora de um grupo ou segmento mais amplo de indivíduos (cor, raça, sexo, nacionalidade, riqueza, etc.). Mas pode, é óbvio, também derivar a discriminação de outros fatores relevantes a um determinado caso concreto específico (destaque nosso).
O combate à discriminação é uma das mais importantes áreas de avanço do direito característico das modernas democracias ocidentais. Afinal, a sociedade democrática distingue-se por ser uma sociedade suscetível a processos de inclusão social, em contraponto às antigas sociedades, que se caracterizam por serem reinos fortemente impermeáveis de exclusão social e individual (destaques nossos).
Também o Direito do Trabalho tem absorvido essa moderna vertente de evolução da cultura e prática jurídicas. No caso brasileiro, essa absorção ampliou-se, de modo significativo, apenas após o advento da mais democrática carta de direitos já insculpida na história política do país, a Constituição da República de 1988 (destaque nosso).”

Por sua vez, o eminente professor Márcio Túlio Viana, na mesma obra acima citada, pág. 357 e 358, no artigo intitulado “A PROTEÇÃO TRABALHISTA CONTRA OS ATOS DISCRIMINATÓRIOS (ANÁLISE DA LEI N. 9.029/95)”, assim se manifesta:

“Somos livres para decidir se, quando, como e quem contratar. Mas é uma liberdade, digamos assim, vigiada, e em boa parte flexionada pelo legislador. Valendo-nos de uma imagem que Couture usou com outros propósitos, poderíamos talvez comparar o empregador a um prisioneiro no cárcere: pode dar alguns passos, e nisso é livre, mas as grades lhe impõem limites ao seu ir e vir.
Aliás, de certo modo, é o que acontece com todas as liberdades. São sempre relativas, na medida em que se interagem com outras liberdades, ou mais propriamente com as liberdades dos outros. O que varia não é a existência do cárcere, mas as suas dimensões e, algumas vezes, a grossura de suas barras.
Tratando-se do contrato de trabalho, a liberdade no “se” e no “quando” é a mais ampla de todas, mas ainda assim não chega a ser absoluta. O empregador é obrigado, por exemplo, a admitir um certo número de aprendizes, proporcional à sua massa de empregados. E não pode, regra geral, contratar substitutos para os grevistas (caso de restrição negativa à liberdade).
Já a liberdade no “como” de todas, é a menor. Mesmo em tempos de acelerada flexibilização, a lei contém ainda, na expressão de La Cueva, um contrato mínimo de trabalho. O empregador só pode se mover em seu próprio desfavor, isto é, criando condições melhores que as previstas em lei, sentença normativa ou convênio coletivo.
Mas é a liberdade no “quem” contratar que nos interessa mais de perto. É dela que cuida a lei n. 9.029/95. O empregador pode escolher entre João e Pedro, ainda que não explique os motivos, e mesmo que não tenha motivos. Mas não pode preferir Pedro, por exemplo, em razão de sua cor (destaque nosso).”

Da análise dos textos transcritos observa-se que a discriminação caracteriza-se pelo tratamento desqualificador de uma pessoa com base em uma característica sua ou em razão de um ato legalmente praticado.
Qualquer  forma de discriminação e violação ao princípio da liberdade é expressamente vedada, pois,  pela legislação ordinária e pela Convenção nº 111 da OIT (qualquer forma de discriminação), bem como pela Constituição Federal, quando adota como princípios fundamentais (art. 1º, II, III e IV) a cidadania, a dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho; e como objetivo fundamental (art. 3º, IV) a promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. Ressalvam-se, apenas, e excepcionalmente, situações especiais, in concreto verificadas,  em que haja pertinência lógica e inafastável entre o fator de discrímem e a função a ser exercida e a discriminação no caso, não ofenda valores constitucionais, tal como ocorre com a seleção de mulheres para guarda em presídio feminino[2].

Encontrar a conceituação  da discriminação negativa (vedada pelo ordenamento jurídico), direta, indireta ou oculta,   e das  ações afirmativas, discorrer sobre os fundamentos constitucionais e legais, de direito interno e internacional,   não é tarefa das mais difíceis. Já existe  certa abundância de narrativas no âmbito do direito material, das mais diversas formas de discriminação, de gênero, étnica, etária, religiosa, de pessoas portadoras de deficiência. No plano formal, pois, a premência da tutela da diversidade no meio ambiente laboral  é foco de defesa em diversos estudos e embora polêmicas ainda existam, tais como aquelas que envolvem a implementação de  ações afirmativas de combate à discriminação racial,  há certa sedimentação. 
 
Ocorre que o direito material para ser plenamente usufruído,  necessita contar com tutela judicial minimamente eficaz, o que, nos parece, deva ser a preocupação central na atualidade, no atinente ao tema discriminação.  
 
Compreendida na seara  formal dos conceitos  de direito material, a discriminação proibida  no meio ambiente laboral ainda não é, s.m.j., encarada com a mesma dedicação quando o tema  é avaliado sob o enfoque da efetividade  do  processo. O equacionamento da questão da prova, notadamente a prova da discriminação indireta, e a compreensão das repercussões sociais, ainda que de um único trabalhador, que tornam adequadas e mesmo imprescindíveis ações civis públicas são dois dos aspectos que merecem destaque e que contribuem, ainda, negativamente, para a eliminação da discriminação odiosa.    
 
No plano internacional, a dificuldade da prova no tema discriminação não passa despercebida. A Diretiva 2000/43/CE do Conselho da União Européia, de 29/06/00, atinente à aplicação  do princípio da igualdade de tratamento entre as pessoas, sem distinção de origem racial ou étnica, prevê expressamente que “a apreciação dos fatos dos quais se pode deduzir que houve discriminação direta ou indireta é da competência dos órgãos judiciais ou outros órgãos competentes, a nível nacional, de acordo com as normas ou a prática do direito nacional. Essas normas podem prever, em especial, que a determinação da discrminação indireta se possa fazer por quaisquer meios de prova, inclusive os estatísticos.”  (g.n.) 
 
A  estatística, diga-se, é ciência e pode perfeitamente serem aproveitadas também pelo Direito, notadamente no difícil tema da discriminação indireta. Graças a Estatística, sabemos  que ao jogarmos a moeda 100 vezes, não haverá, seguramente, 75% de “coroa” ou de “cara”, mais em aproximadamente 50% das vezes  a resposta será necessariamente “cara” e em 50% coroa e essa proporção será cada vez mais certa quanto maior for o número de rodadas. Não se cuida, pois, de coisa de outro mundo, mais de dados a serem aproveitados em matéria de prova, permitidas, obviamente, a discussão das fontes, da atualidade dos dados, etc, desde que alegados em defesa. Mas não se pode desprezar a Estatística em matéria de prova da discriminação, em especial no Direito do Trabalho, em especial quando a discriminação é oculta por instrumentos aparentemente neutros mais que impactam com maior força determinados grupos (discriminação indireta). Como muito bem destaca Maurício Correia de Mello[3]: 
 
“O fato de não existir em nosso país nenhuma orientação expressa nesse sentido não impede que a estatística também seja usada aqui como meio de prova pois evidentemente, as estatísticas produzidas pelos órgãos oficiais são idôneas e não há ilicitude na sua utilização. O Código de Processo Civil menciona alguns meios de prova, mas não esgota a lista de possibilidades. Não é demais dizer que no nosso sistema jurídico o juiz tem bastante   liberdade para apreciação das provas, atribuindo a cada uma delas o valor que entender devido, subjetivamente.”
 
No que tange à prova do ato discriminatório, verificam-se, ainda,  dificuldades extremas e, s.m.j. equivocadas, que alguns julgados impõe à prova do ato ilícito na hipótese da discriminação do trabalhador para fins de indenização ou reintegração no emprego. 
 
Enquanto no plano internacional existem orientações expressas  no sentido da aceitação da Estatística como prova da discriminação indireta, como se viu,  na seara da Justiça do Trabalho parte dos julgados exige a prova mais robusta e indene de dúvidas acerca da discriminação, com mais afinco do que aquela pensada para a justa causa do empregado. Nesse sentido: 
 
EMENTA: REINTEGRAÇÃO NO EMPREGO. Quando não demonstrada a necessária relação de causa-efeito entre o fato de o obreiro ser portador do vírus HIV e a sua dispensa, não há que se cogitar de dispensa discriminatória, o que afasta qualquer hipótese de reintegração no emprego. Ônus da prova que incumbe ao empregado (art. 818 da CLT e art. 333, I, do CPC). (TRT da 4ª Região; data do julgamento: 04 06 1998

R.O.nº01520.202/97-0,1997)



EMENTA.REINTEGRAÇÃO. DANO MORAL.
....
Os fatos imputados ao então diretor da ré são graves. Tanto que, nos termos da legislação penal, constituem crime inafiançável. Hão, pois, fatos de tal gravidade, que restarem inequivocamente demonstrado nos autos. A prova produzida, no entanto, não autoriza, de forma cabal a ilação que lhe pretende extrair a autora.
....
Malgrada a prova da existência do comentário racista alegado, resta debilitada a tese do conteúdo discriminatório da despedida, mormente quando não há respaldo probatório a sustentá-la e a prova produzida aponta na direção oposta ao sustentado pela autora.
....
 Registre-se que, a se admitir a existência das discriminações por motivo de cor apontadas na inicial, causa espécie queira a autora ver-se reintegrada em ambiente no qual supostamente sofreu abalo moral. Nego provimento. Ante o exposto, ACORDAM os Juízes da 1ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região, à unanimidade de votos, negar provimento ao recurso da reclamante. Intimem-se. Porto Alegre, quinta-feira, 15 de junho de 2000. (TRT 4ª REGIÃO ACÓRDÃO 00143.030/98-1);g.n.



 
A leitura dos exemplos acima citados, deixa transparecer que o  principal argumento para  exigir-se do autor prova “cabal” da prática do ato discriminatório   é o de que  não se pode reconhecer este último  na seara trabalhista por sua repercussão penal. O outro argumento é a aplicação,   contra o trabalhador, todo o peso do ônus da prova, com base no disposto nos artigos 818 da CLT e 333 do Código de Processo Civil, deixando a parte contrária na extremamente confortável situação de apenas negar a discriminação e afirmar seu “direito potestativo”, v.g.,  de dispensa imotivada.   
 
                       A nosso ver, os julgados nesse sentido deixam de considerar circunstâncias relevantes em matéria de prova no processo do trabalho e desse modo inviabilizaram, na prática, a eficácia do direito à igualdade e ao trabalho digno assegurado pelo ordenamento jurídico brasileiro. 
                            
                          Em primeiro plano, não se afigura correto confundir-se os aspectos penais e trabalhistas da discriminação, negando-se as conseqüências típicas da reparação civil (não-penal) sob o argumento de que o fato, por configurar crime, requer prova inconteste de valor superior àquela que se exige nas demais causas trabalhistas. Ora, cediço que as responsabilidades penais e não-penais (trabalhistas e civis em sentido estrito) têm pressupostos independentes e não se pode exigir do trabalhador vítima da discriminação que produza na ação trabalhista a prova que se exige para  condenações de âmbito criminal. Neste último, basta lembrar, vige a verdade real, ao contrário do que ocorre nas causas trabalhistas e civis. 
 
                               Quanto à distribuição do ônus da prova, não podem deixar de ser sopesados, também no que se refere à discriminação,  os aspectos de desigualdade de poder inerentes ao Direito do Trabalho. O empregador é o que detém melhores condições de produzir provas dos fatos da relação de emprego, sendo dele, por exemplo, a responsabilidade pela confecção e guarda dos documentos que espelham tal relação jurídica. Não há razão para que, tratando-se do tema discriminação, essa característica especial do processo do trabalho, que é a menor capacidade de o empregado produzir a prova,  seja preterida, ou simplesmente ignorada.
 
                               Ademais, com muito maior propriedade em relação  ao tema da discriminação, não é crível esperar-se que o autor do processo laboral apresente em juízo a confissão escrita do ato ilícito. Não é assim que se comportam as empresas, ordinariamente. As regras de experiência comum, que devem ser expressamente consideradas pelo julgador, nos termos do estatuído no artigo 332 do CPC,  indicam que os empregadores, via de regra, contam com assessoria jurídica suficiente para que não produzam contra si prova escrita da discriminação.  A prova da discriminação, portanto, é indiciária por natureza. 
 
                               Corretamente,  a jurisprudência tem evoluído de forma a temperar adequadamente o ônus da prova da discriminação, de maneira a admitir esta última também como decorrência da inércia da empresa em alegar ou provar (agora sim, cabalmente), a existência de motivo de ordem disciplinar, técnico, econômico ou financeiro para, por exemplo, a não admissão, a dispensa ou preterição em promoções de que se queixa o trabalhador na ação.  Presente o fator reconhecidamente gerador de discriminação, faz todo sentido que seja da parte contrária o ônus de provar a existência de justo motivo para o ato de preterição. Nesse sentido:    
 
EMENTA- RECURSO ORDINÁRIO - REINTEGRAÇÃO - EMPREGADO PORTADOR DE AIDS - RESPONSABILIDADE SOCIAL DA EMPRESA. Impossível colher prova mais robusta da discriminação contra o aidético do que sua dispensa imotivada. É a segregação silenciosa de quem busca livrar-se de um presumido problema funcional lançando o empregado portador do vírus HIV à conta do Poder Público e à sua própria sorte. Como participante de sua comunidade e dela refletindo sucessos e insucessos, ganhos e perdas, segurança e risco, saúde e doença, a empresa consciente de suas responsabilidades sociais atualmente já assimila o dever de colaborar na luta que amplamente se trava contra a AIDS e, através de suas lideranças, convenciona condições coletivas em que se exclui a exigência de teste HIV por ocasião da admissão no emprego ou na vigência do contrato, e veda a demissão arbitrária do empregado que tenha contraído o vírus, assim entendida a despedida que não esteja respaldada em comprovado motivo econômico, disciplinar, técnico ou financeiro. E isso sob o fundamento de que a questão envolve a vulnerabilidade da saúde pública, não podendo a categoria econômica furtar-se à responsabilidade social que inegavelmente detém. Além do mais, a inviolabilidade do direito à vida está edificada em preceito basilar (artigo 5º, caput, da Constituição Federal). Recurso a que se dá provimento quanto a esta matéria. 

(TRT da 2ª Região

Acórdão n. 20091064060, de  01 12 2009

TIPO: RO01   NUM: 00228   ANO: 2007

NÚMERO ÚNICO PROC: RO01 - 00228-2006-035-02-00-6, recurso ordinário, : 4ª  TURMA;DOE SP, PJ, TRT 2ª    Data: 18/12/2009;  ;RECORRENTE(S):Ocione Bastos Fraga; RECORRIDO(S): Banco Bradesco AS; Relatora  Des. WILMA NOGUEIRA DE ARAUJO VAZ DA SILVA ;REVISOR(A)Des.  SERGIO WINNIK) g.n.
 
 
Outro ponto que contribui para a permanência da homogeneidade negativa no trabalho, para o qual queremos chamar a atenção,  diz respeito  às barreiras impostas a tutela coletiva, via ação civil pública, da diversidade no ambiente laboral. Nada mais errôneo, s.m.j., que enxergar o ato discriminatório do trabalhador como ato assunto individual que inviabiliza a ação civil pública, como ainda ocorre em alguns julgados. 
 
A discriminação praticada, mesmo  que dela só haja prova concreta de uma ocorrência,  projeta-se irremediavelmente para além dos limites da pessoa do trabalhador diretamente  vitimado, espraiando-se e irradiando seus efeitos intimidatórios por toda a comunidade de trabalhadores. Suponha-se que a empresa tenha dispensado um  trabalhador em razão de ter adquirido LER/DORT. Admitida e implementada tal  discriminação, pergunta-se: é pertinente aguardar-se o surgimento de novo caso de trabalhador com a mesma enfermidade para que se conclua ser práxis empresarial a dispensa em tais circunstâncias? A resposta, para nós, parece clara. Não. Quem pratica a discriminação é porque acredita, ainda que veladamente e sem passar recibo, na eficácia dela para seu negócio, presumindo-se, portanto, que continuará a adotar tal política gerencial em casos futuros. 
 
Mais que autorizada, portanto, na espécie, seja a discriminação de que naipe for, o uso da ação civil pública  para a obtenção de  resposta célere, via provimentos de urgência, ou mesmo de qualquer resposta positiva para o autor, a pedidos de  tutela inibitória (fazer e não fazer) e reparatória (dano moral coletivo). A par do Ministério Público do Trabalho, sindicatos também devem reverência à erradicação da discriminação, via ações coletivas.  
 
A ofensa a dignidade do trabalhador por atos discriminatórios  implica, necessariamente, em agressão às bases do convívio social harmonioso. Nesse sentido, não há discriminação puramente individual. Há repercussão social  negativa, que merece, além da reparação civil individual cabível (reintegração, sustação de transferência, pagamento de indenização arrecada pela vítima, etc.) que tipificam nossas “reclamações trabalhistas”, também  dos provimentos típicos da ação civil pública, inclusive com ressarcimento do dano coletivo com vista à recomposição dos bens lesados.  A questão foi enfrentada com maestria no seguinte acórdão: 
 
EMENTA: ISONOMIA – COIBIÇÃO DE PRÁTICAS DISCRIMINATÓRIAS – ATO CIRCUNSCRITO A APENAS UMA RELAÇÃO DE TRABALHO – LESÃO DE DIREITO DIFUSO. De todas as  garantias fundamentais, a mais abrangente é a da isonomia. Encontra-se ela  sistematizada em nosso texto constitucional, de forma genérica, em dois  dispositivos (art. 3º, IV e art. 5º, caput). Como todas as garantias fundamentais, a isonomia tem como destinatário primordial o Estado que, no exercício dos seus atos de império, não pode tratar desigualmente ou mesmo de forma discriminatória os cidadãos. Essa acepção da garantia isonômica, no  entanto, não é a única, nem tampouco prevalecente. Com efeito, as garantias fundamentais também têm como destinatário os particulares e não apenas o Estado. Isto quer dizer que as relações de direito privado também devem ser  norteadas pelas garantias fundamentais, devendo o judiciário, como representante do poder estatal, inibir toda e qualquer conduta que possa ferir o manancial de direitos fundamentais. Ora, se a garantia fundamental da isonomia tem seu campo de incidência sobre as relações de trabalho, mesmo
que travadas no campo estritamente privado, não vislumbramos como o seu  desrespeito não possa repercutir de forma genérica no meio social. Partindo da premissa de que o desrespeito de uma garantia fundamental pelo Estado gera interesse para o grupo social, por que não conferir essa mesma importância ao rompimento dos pilares de proteção partindo do ato do  particular? Não é o fato de a transgressão estar circunscrita ao âmbito de uma relação de direito do trabalho que lhe atribui o caráter de direito individual isolado e compartimentalizado. Neste caso, a quantidade é irrelevante. O elemento que poderá materializar a ocorrência de um dano de natureza coletiva ou difusa é a sua repercussão no meio social. O que se  demonstra relevante no caso é a migração do direito fundamental para o âmbito da relação individual de caráter privado. DANO MORAL COLETIVO – OFENSA A GARANTIA FUNDAMENTAL – LESÃO DE DIREITO DIFUSO – REPARABILIDADE.
Concluindo-se pela existência de uma grave transgressão a interesses difusos  da sociedade, há de se acolher a pretensão destinada ao ressarcimento do dano moral coletivo. Com efeito, a reparabilidade do dano moral cometido em desfavor do meio social é questão já assentada no âmbito doutrinário e jurisprudencial. O ataque aos princípios básicos de constituição da sociedade mediante negativa de eficácia de garantias fundamentais configura uma ofensa ao patrimônio moral coletivo. Sendo assim, revela-se útil e até necessário que se proceda à reparação pecuniária do ato atentatório às garantias fundamentais, como forma pedagógica, no sentido de inibir novas  condutas ofensivas. DECISÃO: ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional do Trabalho da 13ª Região, por unanimidade, rejeitar a preliminar de carência do direito de ação; MÉRITO: por maioria, com o voto de desempate do Juiz
Presidente dos trabalhos, dar provimento ao recurso interposto pelo  Ministério Público do Trabalho, para, reformando a sentença às fls. 606/610, condenar o BANCO ABN AMRO REAL S/A: a) a se abster de despedir empregado ou retaliá-lo de qualquer maneira, em razão de ser ele portador do vírus da
AIDS ou estar acometido por qualquer outra enfermidade, fixando, desde logo,  pena pecuniária de R$ 250.000,00 (duzentos e cinqüenta mil reais) por empregado atingido, reversíveis ao Fundo de Amparo ao Trabalhador – FAT  e sem prejuízo de outras medidas para a efetivação da tutela inibitória; b) a  pagar indenização por danos morais coletivos de R$ 250.000,00 (duzentos e cinqüenta mil reais), também reversível ao Fundo de Amparo ao Trabalhador – FAT, vencidos parcialmente os Juízes Relatora e Revisor e contra o voto do  Juiz Assis Carvalho, que fixavam a referida indenização no valor de R$50.000,00 (cinqüenta mil reais). Custas no importe de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), calculadas sobre R$250.000,00 (duzentos e cinqüenta mil reais).
João Pessoa, 19 de janeiro de 2005.” (Autos nº: 01535.2003.003.13.00-7 (R.O.);TRT – 13ª REGIÃO;Publicação: DJ/PB de 29.03.2005. g.n.

                        Por fim, mais do que qualquer conclusão, neste pequeno espaço pretendemos apenas  é pugnar por uma postura de busca de  maior efetividade nos  processos em que se discutem condutas discriminatórias. Posições conservadoras podem mesmo inviabilizar, na prática, o sagrado princípio da igualdade.





















[1] Célia Regina Camachi Stander, Procuradora do Trabalho em São Paulo, formada em Direito pela USP, Especialista em Tutela de Direitos Difusos e Coletivos pela Escola Superior do Ministério Púbico do Estado de São Paulo.
[2] Sobre a pertinência lógica autorizadora, em concreto, da discriminação, consulte-se  “Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade”, de Celso Antonio Bandeira de Mello, Malheiros Editores, 3ª Ed., 3ª tiragem, 1995.
[3] Revista do Ministério Público do Trabalho n. 336, de setembro de 2008, Ed. Ltr.

Sistema e-DOC: TST decide sobre envio de recurso até 24hs

É tempestivo recurso por via eletrônica enviado às 23hs do último dia de prazo


Quando a petição eletrônica for enviada para atender prazo processual, serão consideradas tempestivas as transmitidas até as 24 horas do seu último dia. Com base nesse entendimento, extraído da Lei 11.419/2006, que dispõe sobre a informatização do processo judicial, a Companhia de Bebidas das Américas – AMBEV conseguiu reverter decisão que havia considerado seu recurso intempestivo, pois proposto às 23 horas do último dia do prazo legal.

A empresa havia ingressado com embargos de declaração no TRT da 3ª Região (MG) e este foi considerado improcedente. As partes tiveram ciência da decisão no dia 09 de outubro de 2009 (sexta-feira). Como o dia 12 de outubro foi feriado, o prazo legal para interposição do recurso ordinário (oito dias), iniciou-se em 13 de outubro de 2009 (terça-feira), devendo encerrar-se no dia 20 de outubro de 2009 (terça-feira).

A interposição foi feita por e-mail, enviado no dia 20 de outubro, às 23h. O TRT, com base no artigo 8º do provimento 01/2008 do próprio regional declarou a intempestividade do recurso, pois segundo o referido ato o prazo teria se encerrado às 18h. A Ambev recorreu ao TST, sob o argumento de que o recurso era tempestivo, com base no § 3º da Lei 11.419/2006.

Ao analisar o recurso, a ministra relatora na Terceira Turma do TST, Rosa Maria Weber, deu razão à empresa. Segundo ela, a interposição do Recurso Ordinário da Ambev foi realizada através do sistema eletrônico denominado e-DOC, dentro do prazo e horário previsto na lei. A relatora lembrou que a aplicação da Lei 11.419/2006, no âmbito da Justiça do Trabalho, foi regulamentada pela Instrução Normativa nº 30 do TST, de setembro de 2007.

A turma seguiu unanimemente o voto da relatora ao reconhecer a tempestividade do recurso ordinário da empresa, por violação da Lei 11.419/06, e determinou o retorno dos autos ao TRT da 3ª região, para prosseguir o julgamento.

Processo: RR-112700-90.2009.5.03.0131

FONTE: TST

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Policial Militar

Guarda Civil Metropolitana. Vínculo empregatício. Possibilidade. Presentes os requisitos do vínculo de emprego, irrelevante se torna o fato de a reclamante ser guarda civil, eis que não há qualquer incompatibilidade. Eventual descumprimento de norma da corporação a que está afeita a empregada configura mera infração administrativa, que escapa à competência da Justiça do Trabalho. Entendimento diverso propiciaria enriquecimento ilícito do empregador, que foi beneficiário dos serviços da trabalhadora, não podendo se aproveitar da sua própria torpeza. Inteligência da Súmula nº 386 do C. TST, aplicada analogicamente ao caso. Recurso Ordinário não provido. (TRT/SP - 02003200850102000 - RO - Ac. 14ªT 20100524227 - Rel. DAVI FURTADO MEIRELLES - DOE 11/06/2010)

Gratificação de Função

GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO PERCEBIDA POR MAIS DE 10 ANOS. REVERSÃO AO CARGO EFETIVO. INCORPORAÇÃO AO SALÁRIO. As gratificações ajustadas, pagas durante mais de 10 anos, superam os estritos limites da função exercida e em verdade incorporam-se em definitivo ao salário, uma vez que nítido o caráter remuneratório desta verba. Assim entende a jurisprudência, especialmente sob a ótica da estabilidade financeira, nos termos da Súmula 372 do TST: Percebida a gratificação de função por 10 ou mais anos pelo empregado, se o empregador, sem justo motivo, revertê-lo a seu cargo efetivo, não poderá retirar-lhe a gratificação, tendo em vista o princípio da estabilidade financeira. In casu, a supressão da gratificação caracteriza a vedada redução salarial (art. 7º, VI, da CF) e configura alteração contratual lesiva (art. 468, caput, da CLT). (TRT/SP - 01990200947102009 - RO - Ac. 4ªT 20100469676 - Rel. SERGIO WINNIK - DOE 11/06/2010)

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