sexta-feira, 6 de abril de 2012

DIREITO A DESCONEXÃO

INTRODUÇÃO
Diante da evolução tecnológica facilitando a comunicação à distância, e consequentemente a disponibilidade do empregado em face ao tomar do serviço, o espaço no âmbito pessoal do trabalhador, vem constantemente sofrendo invasões, repercutindo prejuízos, inclusive em sua vida privada.
DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA
Recentes abordagens quanto à aplicabilidade do direito à desconexão também vêm se asseverando aos exercentes de cargos de gestão (gerentes e afins, art. 62, II, da CLT) e aos trabalhadores que exercem atividade externa incompatível com a fixação de horário (art. 62, I, da CLT).[1]
Nesse passo, vale destacar a posição dos doutrinares a respeito do tema:
É consenso na doutrina, com grande prestígio da jurisprudência, principalmente a dos Tribunais Superiores, que a proteção à dignidade da pessoa humana é o fundamento de todo o ordenamento jurídico e também a finalidade última do Direito.[2]
DIREITOS FUNDAMENTAIS

Relaciona-se o direito à desconexão com os direitos fundamentais relativos às normas de saúde, higiene e segurança do trabalho descritas na Constituição Federal quanto à limitação da jornada, ao direito ao descanso, às férias e à redução de riscos de doenças e acidentes de trabalho ( art. 7º, XIII , XV , XVII e XXII, da CF ), que demonstram a preocupação com a incolumidade física e psíquica, bem assim com a restauração da energia do trabalhador.
Essencial às afirmações de Alice Monteiro de Barros:
“No momento em que se opera a admissão do trabalhador, este, leva consigo uma série de bens jurídicos (vida, saúde, capacidade de trabalho, etc.), os quais deverão ser objeto de proteção pelo tomador de serviços, por intermédio da adoção de medidas de higiene e segurança destinadas à prevenção de doenças profissionais e acidentes no trabalho[3].
Igualmente se vincula o direito à desconexão com a tutela do obreiro em face da automação, na forma da lei (art. 7º., XXVII, da CF). Nesse caso, a análise não ocorre sob o tradicional viés da preservação em si do posto de emprego, no sentido de evitar-se a sua substituição em si do posto de emprego, no sentido de evitar-se a sua substituição pela automação, mas sim se centra na necessidade de preservação de adequadas e saudáveis condições de exercício do trabalho em um emprego que está em curso, valorizando-se a tutela da higidez física e psíquica do obreiro e evitando-se o aviltamento correlato oriundo do uso exagerado das novas tecnologias a fim de exercer poder de direção patronal, de modo ininterrupto, em face do trabalhador.
Não bastasse, a par dos direitos fundamentais trabalhistas específicos ou propriamente trabalhistas acima especificados, o direito à desconexão também está relacionado a direitos fundamentais trabalhistas não específicos, a exemplo do direito social fundamental social ao lazer (ar. 6º. Caput, da CF) e dos direitos à intimidade e à vida privada (art.5º. V e X, da lei Maior).

Relembre-se de que há direitos fundamentais que incidem nas relações de trabalho que não são tipicamente trabalhistas, dirigem-se a qualquer cidadão, e portanto, também ao trabalhador, que não se despe de sua condição de pessoa plena ao integrar o contrato de labuta, motivo pelo qual além dos direitos propriamente trabalhistas ou específicos (aqueles que só podem ser exercidos por ele enquanto tal, (art. 7º. A 11 da CF), são-lhe direcionados direitos outros, ditos trabalhistas não específicos.

TELETRABALHO, OU TRABALHO À DISTÂNCIA
Forma nova de prestação de serviços na medida de tentar a não configuração da relação de emprego.
O Trabalhador acaba por perder a própria vida privada, prejudicando o convívio familiar, por transformar a sua residência em local de trabalho.
 Essa situação merece ser cuidada, porque o fato do trabalho ser efetuado na residência do trabalhador por si só não descaracteriza o vínculo de emprego, e nas palavras de Jorge Luiz Souto Maior
“...estes serviços tem possibilitado mais uma exploração velada e irresponsável do capital sobre o trabalho humano.”[4]
Recentemente o art. 6º. Da CLT foi alterado pela Lei 12.551 de 15/12/2011, e passa a vigorar com a seguinte redação:
Art. 6 º. Não se distingue entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador, o executado no domicílio do empregado e o realizado a distância, desde que estejam caracterizados os pressupostos da relação de emprego.
Parágrafo único. Os meios telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão se equiparam, para fins de subordinação jurídica, aos meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão do trabalho alheio. (NR) (Redação dada ao artigo pela Lei nº 12.551, de 15.12.2011, DOU 16.12.2011 )
Assim dispunha o artigo alterado:
"Art. 6 Não se distingue entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador e o executado no domicílio do empregado, desde que esteja caracterizada a relação de emprego."
Diante disso, alguns debates no âmbito jurídico começam a ocorrer, afinal, como podemos compreender o trabalho desenvolvido fora da jornada de trabalho e do domicilio do empregador: horas extras ou sobre-aviso?
Alguns entendem que será devido hora extra, pois, o empregado estará trabalhando fora do horário de trabalho, enquadrando-se perfeitamente na nova redação do artigo 6ª da CLT e
descartam  sobreaviso, porque nos termos do artigo 224 da CLT este instituto é configurado quando o empregado encontra em casa aguardando a qualquer momento o chamado para o serviço.
Mas isso é um entendimento prévio, que demanda um estudo aprofundado.
JURISPRUDENCIA
FÉRIAS NÃO FRUÍDAS - VENDA IRREGULAR - DOBRA DEVIDA - A prática irregular denominada "venda de férias" não encontra amparo no ordenamento trabalhista vigente. As férias fazem parte do patamar mínimo civilizatório dos empregados, e, como norma de medicina e segurança do trabalho, integra o rol dos direitos indisponíveis do trabalhador. Inviável a renúncia de direitos dessa natureza. A empresa tem o dever de participar as férias ao empregado e determinar a sua fruição, porquanto mais importante que eventual enriquecimento com a venda do período é o descanso e consequente desconexão do empregado. A exegese é extraída da constituição federal (ART. 7, XVII) , da clt (ARTS. 129/153) e da convenção 132, da OIT. Sonegado o período mediante "venda" fraudulenta ao empregador, é devida a dobra de que trata o artigo 137, da clt . 2- Intervalo intrajornada - Concessão parcial - Pagamento total do período. A concessão parcial da pausa intervalar é ilegal e impede seja atingido o escopo da norma, qual seja, a alimentação e descanso adequado do trabalhador, a lhe proporcionar o retorno saudável e seguro à continuidade do expediente. Portanto, suprimido em parte o intervalo, é devido o pagamento da remuneração do período correspondente, in totum (OJ 307, DA SDI I, DO C. TST). 3- Contribuições previdenciárias e fiscais - Cota do empregado - Responsabilidade. O sistema de seguridade social possui caráter solidário, sendo financiado por toda a sociedade, inclusive pelos trabalhadores, como estabelece o artigo 195, da cf . Desse modo, ainda que determinado em juízo o pagamento de verbas salariais, subsiste a obrigação do empregado no que diz respeito à sua cota parte de contribuição social. Inteligência da oj 363, da sdi-i, do tst, que abarca inclusive o imposto de renda, porquanto a norma jurídica tributa quem aufere renda, independentemente de ser paga em juízo. Recorre a reclamada, às fls. 78/89, do decreto judicial de procedência em parte da ação (FLS. 56/63). Argui prescrição de todas as férias vencidas + 1/3. No mérito, propugna a reforma do julgado quanto à dobra das férias vencidas + 1/3; Horas extras pela sonegação dos intervalos; Horas extras e adicionais de pagas por fora e reflexos; Indenização pelas despesas com honorários advocatícios; Recolhimentos fiscais e contribuições previdenciárias. Preparo às fls. 90/92. Contrarrazões pelo reclamante, às fls. 93/96. (TRT-02ª R. - Proc. 0000222-74.2010.5.02.0312 - (20111519840) - Rel. Rovirso A. Boldo - DJe 07.12.2011 )
128000019814 - HORAS DE SOBREAVISO AINDA QUE O PORTE DE CELULAR, POR SI SÓ, NÃO TENHA O CONDÃO DE ATRAIR O PAGAMENTO DE HORAS DE SOBREAVISO (ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL Nº 49, DA SDI-I DO C. TST), UMA VEZ EVIDENCIADA A POSSIBILIDADE DE CONVOCAÇÃO DO OBREIRO, A QUALQUER MOMENTO, BEM COMO A OBRIGATORIEDADE DE DESLOCAMENTO ATÉ A EMPRESA PARA ATENDER AO CHAMADO, CERTA É A LIMITAÇÃO DA LOCOMOÇÃO E A DIRETA INTERFERÊNCIA NO DIREITO À DESCONEXÃO COM O TRABALHO, CARACTERIZANDO-SE, ASSIM, O DIREITO AO SOBREAVISO. (TRT-17ª R. - RO 93900-14.2009.5.17.0005 - Relª Desª Claudia Cardoso de Souza - dje 10.02.2011 - p. 18)
117000014611 - RECURSO ORDINÁRIO - DIREITO DO TRABALHO - INTERVALO INTRAJORNADA - Na doutrina de Jorge Luiz Souto Maior, Os períodos de repouso são, tipicamente, a expressão do direito à desconexão do trabalho. Por isto, no que se refere a estes períodos, há de se ter em mente que descanso é pausa no trabalho e, portanto, somente será cumprido, devidamente, quando haja a desvinculação plena do trabalho (in Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, Campinas, nº 23,/2003). Assim, quando apenas havia períodos de aguardo de chamados, e não pausas regulamentares, ao longo da jornada, devida a paga das horas de intervalo. Recurso provido. (TRT-06ª R. - RO 0132600-65.2009.5.06.0005 - 1ª T. - Relª Desª Dinah Figueirêdo Bernardo - DJe 05.10.2010 - p. 131).
CONCLUSÃO
O direito a desconexão é um tema atual, resultado do avanço da tecnologia facilitando a comunicação.
Diante disso, o trabalhador acaba estendendo sua jornada de trabalho, nos períodos que deveria estar descansando, respondendo e-mals, atendendo celulares.
Dependendo do caso concreto, entendo que a questão pode ser prejudicial para ambos os lados, empregados e empregadores. O mau empregador que explora o empregado, e o empregado que de má fé, registra deliberadamente essas atitudes para obter do empregador direitos a horas extras, sem que o empregador tenha autorizado.
Mesmo o empregador tendo a responsabilidade de fiscalizar e controlar, há casos em que a situação vai além desta possibilidade, pois clientes muitas vezes, entram em contato diretamente com o trabalhador, pedindo alguma explicação, seja na hora do almoço,  depois do expediente, ou ainda nos finais de semana.
Entendo como um problema social que feri os direitos fundamentais do trabalhador, e que o direito tem um papel fundamental em normatizar e assegurar a equidade desses casos, principalmente no tange a proteção do trabalhador, a maioria das vezes em situação desvantajosa, por não participar dos lucros da empresa.

BIBLIOGRAFIA
BARROS, Alice Monteiro de. Curso de direito do trabalho. 3. ed. rev. e ampl. São Paulo: LTr, 2007.
BORNHOLDT, Rodrigo Meyer. Métodos para resolução do conflito entre direitos fundamentais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005.
BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Encarregado de vendas ganha sobreaviso por uso do celular. Notícia veiculada na Internet. Disponível em: <http://ext02.tst.jus.br/pls/no01/NO_NOTICIASNOVO.Exibe_Noticia?p_cod_noticia=9211&p_cod_area_noticia=ASCS&p_txt_pesquisa=encarregado%20de%20vendas >. Acesso em: 13 maio 2009.
CALVET, Otávio Amaral. O direito ao lazer nas relações de trabalho. Disponível em: <http://www.calvo.pro.br/artigos/otavio_calvet/otavio_calvet_direito_ao_lazer.pdf >. Acesso em: 01 fev. 2009.
DELGADO, Gabriela Neves. Direito fundamental ao trabalho digno. São Paulo: LTr, 2006.
FLORES, Joaquín Herrera. La reinvención de los derechos humanos. Sevilla: Atrapasueños, 2008.
GOULART, Rodrigo Fortunato; HASSON, Roland. A eficácia horizontal dos direitos fundamentais nas relações de trabalho. Revista Trabalhista Direito e Processo, São Paulo, v. 7, n. 25, jan./mar. 2008.
MAIOR, Jorge Luiz Souto. Do direito à desconexão do trabalho. Disponível em: <http://trt15.gov.br/escola_da_magistratura/Rev23Art17.pdf >. Acesso em: 5 abr. 2009.



[1] Jorge Luiz Souto. Do direito à desconexão do trabalho. Disponível em: <http://trt15.gov.br/escola_da_magistratura/Rev23Art17.pdf >. Acesso em: 12 dez. 2011
[2] SCHIAVI, Mauro. Proteção jurídica à dignidade da pessoa humana do trabalhador. Disponível em: <http://www.lacier.com.br/artigos/protecao_juridica.doc >. Acesso em: 12 dez. 2011, p. 20; MAIOR,
[3] BARROS, Alice Monteiro de. Curso de direito do trabalho. 3. ed. rev. e ampl. São Paulo: LTr, 2007. p. 1036.
[4] Jorge Luiz Souto Maior Título: DO DIREITO À DESCONEXÃO DO TRABALHO. Disponível em: http://online.sintese.com. Acesso em: 14.12.2011

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